A Caverna

Esta é a caverna, quando a caverna nos é negada/Estas páginas são as paredes da antiga caverna de novo entre nós/A nova antiga caverna/Antiga na sua primordialidade/no seu sentido essencial/ali onde nossos antepassados sentavam a volta da fogueira/Aqui os que passam se encontram nos versos de outros/os meus versos são teus/os teus meus/os eus meus teus /aqui somos todos outros/e sendo outros não somos sós/sendo outros somos nós/somos irmandade/humanidade/vamos passando/lendo os outros em nós mesmos/e cada um que passa se deixa/essa vontade de não morrer/de seguir/de tocar/de comunicar/estamos sós entre nós mesmos/a palavra é a busca de sentido/busca pelo outro/busca do irmão/busca de algo além/quiçá um deus/a busca do amor/busca do nada e do tudo/qualquer busca que seja ou apenas o caminho/ o que podemos oferecer uns aos outros a não ser nosso eu mesmo esmo de si?/o que oferecer além do nosso não saber?/nossa solidão?/somos sós no silêncio, mas não na caverna/ cada um que passa pinta a parede desta caverna com seus símbolos/como as portas de um banheiro metafísico/este blog é metáfora da caverna de novo entre nós/uma porta de banheiro/onde cada outro/na sua solidão multidão/inscreve pedaços de alma na forma de qualquer coisa/versos/desenhos/fotos/arte/literatura/anti-literatura/desregramento/inventando/inversando reversamento mundo afora dentro de versos reversos solitários de si mesmos/fotografias da alma/deixem suas almas por aqui/ao fim destas frases terei morrido um pouco/mas como diria o poeta, ninguém é pai de um poema sem morrer antes

Jean Louis Battre, 2010

29 de janeiro de 2014

Inserção em circuitos ideológicos






Gravar nas garrafas de refrigerantes (embalagens de retorno) informações e opiniões críticas, e devolvê-las à circulação. Utiliza-se o processo de decalque (silk-screen) com tinta branca vitrificada, que não aparece quando a garrafa está vazia e sim quando cheia, pois então fica visível a inscrição contra o fundo escuro do liquido Coca-Cola.
Declarações Cildo Meireles:

Eu me lembro que em 1968-69-70, porque se sabia que estávamos começando a tangenciar o que interessava, já não trabalhávamos com metáforas (representações) de situações. Estava-se trabalhando com a situação mesmo, real. Por outro lado, o tipo de trabalho que se estava fazendo, tendia a se volatilizar e esta já era outra característica. Era um trabalho que, na verdade, não tinha mais aquele culto do objeto, puramente; as coisas existiam em função do que poderiam provocar no corpo social. Era exatamente o que se tinha na cabeça: trabalhar com a idéia de público. Naquele período, jogava-se tudo no trabalho e este visava atingir um número grande e indefinido de pessoas: essa coisa chamada público. Hoje em dia, corre-se inclusive o risco de fazer um trabalho sabendo exata­mente quem é que vai se interessar por ele. A noção de público, que é uma noção ampla e generosa, foi substituída (por deformação) pela noção de consumidor, que é aquela pequena fatia de público que teria o poder aquisitivo.

 Na verdade, as "Inserções em circuitos ideológicos" nasceram da necessidade de se criar um sistema de circulação, de troca de informações, que não dependesse de nenhum tipo de controle centralizado. Uma língua. Um sis­tema que, na essência, se opusesse ao da imprensa, do rádio, da televisão, exemplos típicos de media que atingem de fato um público imenso, mas em cujo sistema de circulação está sempre presente um determinado controle e um determinado afunilamento da inserção. Quer dizer, neles a 'inserção' é exercida por uma elite que tem acesso aos níveis em que o sistema se desenvolve: sofisticação tecnológica envolvendo alta soma de dinheiro e/ou poder. 



As "Inserções em circuitos ideológicos" nasceram com dois projetos: o projeto "Coca-Cola" e o projeto "Cédula". O trabalho começou com um texto que fiz em abril de 1970 e parte exatamente disso: 1) existem na sociedade deter­minados mecanismos de circulação (circuitos): 2) esses circuitos veiculam evidentemente a ideologia do produtor, mas ao mesmo tempo são passíveis de receber inserções na sua circulação: 3) e isso ocorre sempre que as pessoas as deflagrem. 


 As "Inserções em circuitos ideológicos" surgiram também da constatação de duas práticas mais ou menos usuais. As correntes de santos (aquelas cartas que você recebe, copia e envia para as pessoas) e as garrafas de náufragos jogadas ao mar. Essas práticas trazem implícita a noção do meio circulante, noção que se cristaliza mais nitidamente no caso do papel-moeda e, metaforicamente, nas embalagens de retorno (as garrafas de bebidas, por exemplo). 

 Do meu ponto de vista, o importante no projeto foi a introdução do conceito de 'circuito', isolando-o e fixando-o. E esse conceito que determina a carga dialética do trabalho, uma vez que parasita ria todo e qualquer esforço contido na essência mesma do processo (media). Quer dizer, a embalagem veicula sempre uma ideologia. Então, a idéia inicial era a constatação de 'circuito' (natural), que existe e sobre o qual é possível fazer um trabalho real. Na verdade, o caráter da 'inserção' nesse circuito seria sempre o de contra-informação. 

 Capitalizaria a sofisticação do meio em proveito de uma ampliação da igualdade de acesso à comunicação de massa, vale dizer, em proveito de uma neutralização da propaganda ideológica original (da indústria ou do Estado), que é sempre anestesiante. É uma oposição entre consciência (inserção) e anestesia (circuito), considerando-se consciência como função de arte e anestesia como função de indústria. Porque todo circuito industrial normal­mente é amplo, mas é alienante (ado).
 Por pressuposto, a arte teria uma função social e teria mais meios de ser densamente consciente. Maior densidade de consciência em relação à sociedade da qual emerge. E o papel da indústria é exatamente o contrário disso. Tal qual existe hoje, a força da indústria se baseia no maior coeficiente possível de alienação. Então as anotações sobre o projeto "Inserções em circuitos ideológicos" opunham justamente a arte à indústria. 

(...) 

 Porque tem uma transação em artes plásticas que se baseia ou na mística da obra em si (embalagem: tela, etc.) ou na mística do autor (Salvador Dali ou Andy Warhol, por oposição, são exemplos vivos e atuais): ou parte para a mística do mercado (o jogo da propriedade: valor de troca). A rigor, nenhum desses aspectos deveria ser prioritário. No momento em que há distinções nessa ou naquela direção, surge a distinção de quem pode fazer arte e quem não pode fazer. Tal como eu tinha pensado, as "Inserções" só existiriam na medida em que não fossem mais a obra de uma pessoa. Quer dizer, o trabalho só existe na medida em que outras pessoas o pratiquem. Uma outra coisa que se coloca, então, é a idéia da necessidade do anonimato. A questão do anonimato envolve por extensão a questão da propriedade. Não se trabalharia mais com o objeto, pois o objeto seria uma prática, uma coisa sobre a qual você não poderia ter nenhum tipo de controle ou propriedade. E tentaria colocar outras coisas: primeiro, atingiria mais gente, na medida em que você não precisaria ir até a informação, pois a informação iria até você; e, em decorrência, haveria condições de 'explodir' a noção de espaço sagrado. 

(...) 

Enquanto o museu, a galeria, a tela, forem um espaço sagrado da representação, tornam-se um triângulo das Bermudas: qualquer coisa, qualquer idéia que você colo­car lá vai ser automaticamente neutralizada. Acho que a gente tentou prioritariamente o compromisso com o público. Não com o comprador (mercado) de arte. Mas com a platéia mesmo. Esse rosto indeterminado, o elemento mais importante dessa estrutura. De trabalhar com essa maravilhosa possibilidade que as artes plásticas oferecem, de criar para cada nova idéia uma nova linguagem para expressá-la. Trabalhar sempre com essa possibilidade de transgressão ao nível do real. Quer dizer, fazer trabalhos que não existam simplesmente no espaço consentido, consagrado, sagrado. Que não aconteçam simplesmente ao nível de uma tela, de uma superfície, de uma representação. Não mais trabalhar com a metáfora da pólvora - trabalhar com a pólvora mesmo.  

*Extraído do depoimento de CM registrado na pesquisa Ondas do corpo, de Antônio Manuel Copy-desk e montagem do texto: Eudoro Augusto Macieira. Publicado no Livro "Cildo Meireles"  da FUNARTE. Rio de Janeiro, 1981.

28 de janeiro de 2014

choque

útero da caverna

o homem branco escreve seus esquecimentos
os poetas são os arqueólogos da cidade viva
de uma civilização perdida de sabedorias torpes
os poetas são assassinos do cotidiano
os poetas são aventureiros de um bairro proibido
bailando nas noites longas
bebendo cerveja quente
nos ventos frios dos becos do mundo

na pauta o sangue dos povos esquecidos
que não tem mais suas línguas
a língua dos esquecimentos
a língua dos poetas mortos
está no corpo dos poetas vivos
poesia é corpo
é língua quente que lambe as pedras do mundo
é beijo no vento
e dente rangendo
é alma doendo
não querer que se atreve
não dizer que se fala
querer que não cala
calar que não para
parar que não cansa
cansar que não parte

ficar é ter certezas
partir é ter caminhos

a língua que mata com os seus contratos
contrato é poesia morta
arma de advogados

ninguém mais dá a sua palavra
só o poeta na praça
que dá sua palavra de graça
pois ela não vale nada

o livro
é letra morta

contrato é palavra vendida
poesia é palavra vivida
é pedra que se atira
não é a primeira nem a última
& não se atira nos outros
mas sim no meio do caminho
feito barricada
que barra o rumo do sempre
buscando o nunca antes visto

poesia é pedra no caminho
como um cristo crucificado
que depois de morto volta em meio a liturgia
transformando vinho em sangue
pão em corpo
só a comunhão do corpo com o sangue faz poesia
não é no papel escrito nem no alto altar dos ditos nobres tempos
mas com pé na praça e no museu dos povos
a poesia é liturgia a do esquecimento
esqueçamos o viver tão pouco que vivemos
esquecer é refazer

esqueçamos o caminho tantas vezes percorrido
pois já sabemos o seu trágico destino
desatino deste caminhar tão insensato

voltemos ao útero da caverna para encontrar outras ideias

Salvador Passos

Poesia Pura

Se esta é a busca da noite enquanto noite,
A busca intensa que nada perturba,
Nego a sensibilidade, pois ela acrescenta.
Nego a compreensão, pois ela já tem noções
E pode perturbar a flor pelo conhecer do homem.
Hoje não relaciono, não comprometo.
Quero a coisa em seu íntimo mais grave
Quero a coisa, essencialmente a coisa,
A coisa metafísica, para provar a impossibilidade.

José Carlos Capinan

Vida

Só a poesia possui as coisas vivas. O resto é necropsia.

Mário Quintana

21 de janeiro de 2014

Hiato





Em agosto de 2000, um grupo de manifestantes organizou uma ocupação em um grande shopping da zona sul da cidade do Rio de Janeiro. O episódio obteve grande repercussão na imprensa nacional e ainda hoje é discutido por alguns pensadores. O filme recuperou imagens de arquivo e traz entrevistas de alguns personagens 7 anos após essa inusitada manifestação.

17 de janeiro de 2014

Poetry in a time of crisis

Read ate the event "Poetry in a Time of Crisis - Is Poetry Enough (April, 2004)", at te University of California, Santa Cruz

First I would like to say two things:
          One, I believe poetry exclusively occurs when it is discussed. [i.e. “Poetry” as a privileged structure is an anachronistic notion. I can only stand poetry in the context of prose].
          Two, Americans should leave Afghanistan and Iraq so writers and clerks can move to more boring topics.
          I’ve learned something over the years. [I noticed how my English derives from clichés, as if I was writing from the debris; what Eileen Myles said at the conference after telling her story reading in English at Russia and the reaction of the audience, “Writing with a filthy language”].
          “I I’ve learned something over the years”. The instant we’re talking about a crisis we are hidings ours.
          [This comes from my Mexican background and my training in Gestalt psychotherapy; the projections we make, how to recuperate those projections in order to reorganize the self, to not impose on the world was it ours. It also comes from Guangfan’s “There is nothing in the whole universe that is not you”; the basic Upanishad teaching “Thou are you” and Hegel’s comment at his Phenomenology of Spirit regarding philosophy starting only once we recognized ourselves in/with the absolute other. Mexican popular culture says: “No the hagas pato” (lit. Don’t make yourself a duck, meaning, don’t pretend you are not you, don’t turn into a third person in order to not assume the responsibilities of knowing you are the person you accuse, don’t become 3 in order to not accept you are both 1 and 2].
          I take “crisis” not a crisis I too am provoking. At the same time the victim and the agent of imperialism in every case. Something I share with Americans].
          Iraq, for example, is Bush’s way to hide he is the crisis itself.
          Bush is our way to hide we are Bush.
          It’s easy to blame governments when they in fact do represent awfull societies.
          I only can call poetry the most critical voice against every order, including its own.
          I suspect as poets we take advantage of times of crisis to try to offer poetry as part of the solution. Maybe to hide poetry is part of the problem.
          In saying “Poetry in a time of crisis” I certified poetry.
          I certified it as part of a time.
          As part of a time of crisis, which is something really good for poetry.
          Poetry in a time of crisis must be useful. At least in that phrase.
          That phrase is optimistic.
          It makes poetry look good.
          Part of the solution. Not part of the problem.
          But I think poetry is part of the problem.
          In a way Bush does poetry too.
          I may say his poetry is pretty bad but it’s poetry too.
          Bush tries to cling meaning. He tries to make the audience feel the ecstasy of words. He performs.
          The president behaves similarly to poets I know.
          I am now doing what Bush does much better than me.
          No wonder why poets decide to be poets. They become Bush.
          There’s only one step from the blank page to the White House. I’m in it.
          I am Bush.
          Poetry in a time of crisis can also mean poetry is an emergency measure.
          Poetry as something you reuse or return to when things get worst.
          For example, if you’re depressed. Or there’s a war down there in Iraq.
          You can make an anthology out of emergency poetry like this.
          Poetry is part of the problem.
          Emergency measures follow a psychology of panic.
          Red or yellow alerts.
          Put some poetry into the dying nation, into the dying discourse.
          Poetry in a time of crisis. Poetry in yellow alert. Or red.
          How can poetry help?
          Somebody may offer this clue: poetry can help not getting in the way. For example promoting the end of speeches. A country where every politician that tries to give an speech –especially a speech to the nation—is killed.
          [I liked Walter Lew’s approach, ‘talking again’ about Spirit as something you need before doing poetry. And after. No spirit, no poetry. What he meant by “Spirit” I think was the beyond-deep-cultures-are].
          Yet that clue would only be a pretty bad joke.
          The way poetry does not help.
          It’s not part of the solution but just part of the laughter.
          México and the United are nations that resemble each other too much. They should be completely different, so different that they would go on war every two or three months. Instead they go to bed every four years.
          Countries that laugh too much. Part of the problem is laughter.
          How come you laugh when a political joke is done?
          Why SNL?
          How did we get to this point?
          Because poetry worked.
          What poetry aim at, building the common I, the Nosotros, the We / was achieved.
          Homer wanted to praise the heroes. He did. The heroes were praised.
          Whitman sang America. He achieved his goal.
          Poetry is full of successes.
          Poetry has been historically linked to war.
          Poetry is always trying to put an end to a war that continues wars that poetry helped to instigate.
          Whitman is full of bullshit American poetry hasn’t get rid of.
          Whitman was very American. Free verse means having no meters. No limits. Respecting no borders. Free verse breaks the territories, makes it bigger. Free verse was how poetry materialized on the page the imperialism of the United States. Why being American was the best thing that could happen to the rest of the continent.
          Free verse explains how Mexico was stolen of half its territory through a take over, an expansion of the map of the United States.
          In fact, Whitman supported that war.
          Whitman wanted to construct a space-time where/when everything fitted. That’s why Whitman broke the conventions of how much text could be written, how long could the line be. That’s why Whitman wrote so much. Wrote those heroic lists, those listings. Groceries of History. The many landscapes. The different peoples. Every thing: America.
          [I am here trying to start a discussion on how from Whitman to Stein, the way “America” writes reflects/refracts the imperialism this writing is developing under, developing in its own structures. Acker would have agreed on this I think].
          So, from this point on we are going to call “America” the image of a space-time where/when everything is there/then. The containment of All. What Pound called “Vortex” and Borges “Aleph”.
          What we forget conceiving such a total-time/space is that a system of simultaneous realities taking place at once would make all of them absurd.
          “America” is a comical nightmare.
          Viewing poetry in a time of crisis doesn’t help to put an end to the crisis, it only helps to make poetry (again) a possible solution, a praxis that can really mean something good for the culture it belongs to; viewing poetry in a time of crisis puts the emphasis on the time of crisis, erases the fact that the institution of poetry is part of the crisis, that poetry is in a crisis itself.
          [My reading of Efraín Huerta, Nicanor Parra, Renato Leduc, etc, gave me this ideas from the start: we received literary ‘poetry’ from the Western tradition, at one point we dominated that and even contributed our own thing to It, but let’s not forget ‘poetry’ is part of the Western colonial heritage, a post-colonial self-critique stand implies a going beyond ‘poetry’].
          Times of crisis help poetry hide its own crisis. I think instead of thinking how can poetry help in a time of crisis, think how poetry has collaborated for the production of a crisis, how that production of a crisis makes a culture risks itself, and thus having to strengthen the strategies to perpetuate itself using the institution of crisis as an excuse.
          To make poetry a possible measure. To make ourselves forget we live in cultures that are dying, cultures that want to kill.
          I think poetry is part of the obscurity.
          I think poetry is the place where people go when they want to miss therapy.
          The place people go when they are to snob to go to the movies but they still want to pretend their life can have meaning as their moon, an elevator to acquire more power or at least meet the readers.
          The readers, that group of people who want the same stuff poets crave for, but don’t have the courage even to write.
          Or to corrupt themselves in order to publish.
          What I am saying is I don’t believe poetry can fix.
          Nor I believe poetry should be saved.

          (How much more I would have enjoy 9-11 if the twin towers had been full, completely packed, with poetry books].

          I think Wittgenstein was right when he realized he should concentrate on proving philosophy could do basically nothing.
          When crisis arise I’m one of those persons that think words can help prevent the catastrophe. This is one of the reasons I consider myself a poet. I believe in alerts. I’m part of the problem.
          Poetry should not look for ways to survive. But the poet, at least, should make an effort to disclose all the information she or he has historically used to gain authority.
          Show even a dying cultural practice like poetry can be more honest than usual politics.
          Poetry should unveil where its authority comes from. Should push its own contradictions, let them come out of the closet. Should push the crisis further until the authorities that created it to remain in power are remove by the continuation of the crisis until nothing remains.
          I came from all the way from Mexico, made lines, ask for a permit, say hi to American Immigration agents, lie in the airport, ate peanuts, had a ride, I came all the way from Mexico to basically accept I have nothing to say.
          I only come here to do what I think poets should do every opportunity they have: contradict ourselves all we can right in front of the audience we once tried to convince poetry was something good, something we should share, something that helped. Publicly and very openly contradict ourselves until the laughter stops, until there’s no credibility left in the authority we inherit or won ourselves, until it is made clear those who have authority have stolen it.
          The function of poetry is to lose its function. The function of poetry is to diminish the general notion of authority.

Heriberto Yepez

10 de janeiro de 2014

European Parliament Invites Snowden to Testify


A European parliament committee has invited Edward Snowden to testify via video link in its investigation of US surveillance practices.

The justice and civil liberties committee voted 36-2 with one abstention on Thursday to seek testimony from the former NSA contractor, who has exposed the reach of the US secret surveillance apparatus.

No date has been proposed and it was not immediately clear if Snowden would accept the invitation.
The investigation is aimed at drafting policy recommendations to better protect the privacy of European citizens and improve IT security in EU institutions.

Snowden has been granted temporary asylum in Moscow following his revelations, which have prompted a global debate over the limits of surveillance and the value of privacy.

http://www.theguardian.com/world/2014/jan/09/edward-snowden-invited-testify-video-european-parliament-nsa-surveillance

9 de janeiro de 2014

8 de janeiro de 2014

pleonasmo

eis que o próprio já se faz impróprio
como espaço entre os outros que não sou

o eu que nunca chega
o sorriso já perdido
na medida do que não se mede
incomensurável ser que não se é
o eu mesmo vaga;
como hiato entre o lapso e a memória
sonho envolto em vulto
registrado em alguma sombra passageira
cadafalso do cadáver enforcado na gravata
condenado à gelada superfície do espelho
pleonasmo arrastado de mim mesmo

Salvador Passos

7 de janeiro de 2014

Educação Infantil Padrão Fifa





É a questão urbana, estúpido!

A vida nas cidades brasileiras piorou muito a partir dos últimos anos da década passada. Considerando que a herança histórica já não era leve, o que aconteceu para torná-la pior?



Quem acompanha de perto a realidade das cidades brasileiras não estranhou as manifestações que impactaram o país em meados de junho de 2013.1 Talvez a condição de jovens, predominantemente de classe média, da maioria dos manifestantes exija uma explicação um pouco mais elaborada, já que foi antecedida pelos movimentos fortemente apoiados nas redes sociais. Mas no Brasil é impossível dissociar as principais razões, objetivas e subjetivas desses protestos, da condição das cidades. Essa mesma cidade que é ignorada por uma esquerda que não consegue ver ali a luta de classes e por uma direita que aposta tudo na especulação imobiliária e no assalto ao orçamento público. Para completar, falta apenas lembrar que há uma lógica entre legislação urbana, serviços públicos urbanos (terceirizados ou não), obras de infraestrutura e financiamento das campanhas eleitorais.

As cidades são o principal local onde se dá a reprodução da força de trabalho. Nem toda melhoria das condições de vida é acessível com melhores salários ou com melhor distribuição de renda. Boas condições de vida dependem, frequentemente, de políticas públicas urbanas – transporte, moradia, saneamento, educação, saúde, lazer, iluminação pública, coleta de lixo, segurança. Ou seja, a cidade não fornece apenas o lugar, o suporte ou o chão para essa reprodução social. Suas características e até mesmo a forma como se realizam fazem a diferença.

Mas a cidade também não é apenas reprodução da força de trabalho. Ela é um produto ou, em outras palavras, um grande negócio, especialmente para os capitais que embolsam, com sua produção e exploração, lucros, juros e rendas. Há uma disputa básica, como um pano de fundo, entre aqueles que querem dela melhores condições de vida e aqueles que visam apenas extrair ganhos.

A cidade constitui um grande patrimônio construído histórica e socialmente, mas sua apropriação é desigual e o nome do negócio é renda imobiliária ou localização, pois ela tem um preço devido a seus atributos. Isso tem a ver também com a disputa pelos fundos públicos e sua distribuição (localização) no espaço.2

Como integrantes de um país da periferia do capitalismo, em que pesem as novas nomenclaturas definidas pelo mainstream, as cidades brasileiras carregam uma herança pesada. A desigualdade social, uma das maiores da América Latina, e a escravidão vigente até pouco mais de um século atrás são características que se somam a um Estado patrimonialista e à universalização da “política do favor”. De que forma essas características aparecem nas cidades? Como não é o caso de fazermos uma leitura extensa, pois este texto é apenas um ponto de partida, vamos priorizar o fato de que grande parte de nossas cidades é construída pelos próprios moradores em áreas invadidas – muitas delas ambientalmente frágeis – ou adquiridas de loteadores ilegais. Para a construção desses bairros não contribuem arquitetos ou engenheiros, tampouco há observância de legislação urbanística ou de quaisquer outras leis, até mesmo para a resolução dos (frequentes) conflitos, para a qual não contribuem advogados, cortes, juízes ou tribunais. Trata-se de uma força de trabalho que não cabe no mercado residencial privado legal, que por sua vez (e por isso mesmo) é altamente especulativo. Trata-se, portanto, de uma força de trabalho barata, segregada e excluída da cidade legal. Assim como vivemos a industrialização dos baixos salários, podemos dizer que vivemos a urbanização dos baixos salários. A melhoria desses bairros é fonte inesgotável do velho clientelismo político: trocam-se por votos a pavimentação de uma rua, a iluminação pública, uma unidade de saúde, uma linha de ônibus etc.

A cidade formal, destinada a ser simulacro de algumas imagens-retalhos do “Primeiro Mundo”, é a outra face da moeda. Uma não existe sem a outra. Os exemplos virão quando tratarmos do momento atual.

Foi sobre essa base extremamente desigual que se deu, no início dos anos 1980, o ajuste fiscal. O Brasil vinha há quarenta anos num crescimento acima dos 7% ao ano. As migalhas desse banquete traziam algum conforto para a população migrante, que chegava aos milhares nas cidades, em especial nas principais metrópoles. Com a globalização e o ajuste fiscal, a tragédia urbana se aprofundou.

A contar a partir dos anos 1980, o impacto das décadas seguintes de baixo crescimento, alto desemprego e recuo das políticas públicas e sociais determinadas pelo receituário neoliberal pode ser medido por muitos indicadores, mas vamos fazê-lo aqui pelo aumento da violência urbana. A taxa de homicídios cresceu 259% no Brasil entre 1980 e 2010. A principal vítima dos homicídios é o jovem negro e pobre, morador da periferia metropolitana.3

Com a globalização, o território brasileiro passa por notável transformação. Mudam as dinâmicas demográfica, urbana e ambiental, além das social e econômica. A exportação de commodities – grãos, carnes, celulose, etanol, minérios – ganha o centro da política econômica e sua produção reorienta os processos demográficos. A urbanização se interioriza. O tsunami dos capitais globais e nacionais passou antes pelo campo, subordinando o que encontrou pela frente: terras indígenas ou de quilombolas, florestas amplamente derrubadas, o MST, criminalizado, e lideranças, inclusive religiosas, assassinadas.

Contraditoriamente, foi nesse período que floresceu uma nova política urbana, em torno da qual se organizaram movimentos sociais, pesquisadores, arquitetos, urbanistas, advogados, engenheiros, assistentes sociais, parlamentares, prefeitos, ONGs etc. Construiu-se a Plataforma de Reforma Urbana, e muitas prefeituras de “novo tipo” (ou democrático-populares) adotaram novas práticas urbanas. Além de incluir a participação social – orçamento participativo, por exemplo –, priorizou-se a urbanização da cidade ilegal ou informal, que era invisível até então para o urbanismo e as administrações públicas. Esse movimento logrou criar um novo quadro jurídico e institucional ligado às cidades – política fundiária, habitação, saneamento, mobilidade, resíduos sólidos –, além de novas instituições, como o Ministério das Cidades (2003), o Conselho das Cidades (2004) e as conferências nacionais das Cidades (2003, 2005 e 2007). O Estatuto da Cidade, festejado no mundo todo como exemplar, foi aprovado no Congresso após treze anos de luta popular, em 2001.

Por mais paradoxal que possa parecer, apesar de todo esse avanço institucional, quando o governo Lula retomou em 2009 os investimentos em habitação e saneamento numa escala significativa, após quase trinta anos de estagnação nesse sentido, as cidades se orientaram em uma direção desastrosa.

As primeiras medidas de combate à fome e à pobreza constituíram um círculo virtuoso de fortalecimento do mercado interno. Os principais programas sociais do governo Lula, continuados pelo de Dilma Rousseff, foram o Bolsa Família, o Crédito Consignado, o Programa Universidade para Todos (ProUni), o Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e o Programa Luz para Todos. Garantiu-se também um aumento real do salário mínimo (de cerca de 55%, entre 2003 e 2011, conforme o Dieese). Os classificados em “condição de pobreza” diminuíram sua representação de 37,2% para 7,2% nesse mesmo período. Além disso, o crescimento tanto da economia quanto das taxas de emprego trouxe esperança de dias melhores.4

Em 2007, o governo federal lançou o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), voltado para o investimento em obras de infraestrutura econômica e social. O modelo visava à desoneração fiscal de produtos industriais e buscava alavancar o emprego na indústria da construção. Após a crise de 2008, essa orientação foi aprofundada. Em 2009, foram lançados o PAC II e o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida, desenhado por empresários da construção e do mercado imobiliário em parceria com o governo federal. Teve então início um boom imobiliário de enormes proporções nas grandes cidades. Enquanto em 2009 o PIB brasileiro e da construção civil foram negativos, contrariando a tendência anterior, em 2010 o crescimento nacional foi de 7,5% e o da construção civil, de 11,7%.5 Em seis regiões metropolitanas, o desemprego, que atingia 12,8% em 2003, caiu para 5,8% em 2012. A taxa de desemprego da construção civil no período diminuiu de 9,8% para 2,7%.6 O investimento de capitais privados no mercado residencial cresceu 45 vezes, passando de R$ 1,8 bilhão em 2002 para R$ 79,9 bilhões em 2011,7 e os subsídios governamentais (em escala inédita no país) cresceram de R$ 784.727 para mais de R$ 5,3 bilhões em 2011.8

O coração da agenda da reforma urbana, a reforma fundiária/imobiliária, foi esquecido. Os movimentos sociais ligados à causa se acomodaram no espaço institucional em que muitas das lideranças foram alocadas. Sem tradição de controle sobre o uso do solo, as prefeituras viram a multiplicação de torres e veículos privados como progresso e desenvolvimento. Certa classe média viu suas possibilidades de galgar à casa própria aumentarem, especialmente graças às medidas de financiamento estendido e à institucionalização do seguro incluídas no Minha Casa, Minha Vida.

Com exceção da oferta de emprego na indústria da construção, para a maioria sobrou o pior dos mundos. Em São Paulo, o preço dos imóveis aumentou 153% entre 2009 e 2012. No Rio de Janeiro, o aumento foi de 184%. A terra urbana permaneceu refém dos interesses do capital imobiliário e, para tanto, as leis foram flexibilizadas ou modificadas, diante de urbanistas perplexos.9 A disputa por terras entre o capital imobiliário e a força de trabalho na semiperiferia levou a fronteira da expansão urbana para ainda mais longe: os pobres foram para a periferia da periferia.10 Novas áreas de proteção ambiental acabam sendo invadidas pelos sem alternativas, pois a política habitacional está longe do núcleo central do déficit.11 Os despejos violentos foram retomados, mesmo contra qualquer leitura da nova legislação conquistada por um Judiciário extremamente conservador.12 Favelas bem localizadas na malha urbana sofrem incêndios, sobre os quais pesam suspeitas alimentadas por evidências constrangedoras.13

Os megaeventos – como a Copa e as Olimpíadas – acrescentam ainda mais lenha nessa fogueira. Os capitais se assanham na pilhagem dos fundos públicos, deixando inúmeros elefantes brancos para trás. Mas é com a condição dos transportes que as cidades acabam cobrando a maior dose de sacrifícios por parte de seus moradores. E embora a piora de mobilidade seja geral – isto é, atinge a todos –, é das camadas de rendas mais baixas que ela vai cobrar o maior preço.

O tempo médio das viagens em São Paulo era de 2 horas e 42 minutos em 2007. Para um terço da população, esse tempo é de mais de três horas.14

A desoneração dos automóveis somada à ruína do transporte coletivo fizeram dobrar o número de carros nas cidades. Em 2001, havia em doze metrópoles brasileiras 11,5 milhões de automóveis e 4,5 milhões de motos; em 2011, 20,5 milhões e 18,3 milhões, respectivamente. Os congestionamentos em São Paulo, onde circulam diariamente 5,2 milhões de automóveis, chegam a atingir 295 quilômetros das vias.

O governo brasileiro deixou de recolher impostos no valor de R$ 26 bilhões desde o final de 2008 (nesse mesmo período, foram criados 27.753 empregos), e US$ 14 bilhões (quase o mesmo montante dos subsídios) foram enviados ao exterior. Há mais subsídios para a circulação de automóveis (incluindo combustível e outros itens) do que para o transporte coletivo.15

A prioridade ao transporte individual é complementada pelas obras de infraestrutura dedicadas à circulação de automóveis. Verdadeiros assaltos aos cofres públicos, os investimentos em viadutos, pontes e túneis, além de ampliação de avenidas, não guardam qualquer ligação com a racionalidade da mobilidade urbana, mas sim com a expansão do mercado imobiliário, além, obviamente, do financiamento de campanhas.

O forte impacto da poluição do ar na saúde da população de São Paulo, com consequente diminuição da expectativa de vida, tem sido estudado pelo médico Paulo Saldiva, pesquisador da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto Saúde e Sustentabilidade. O comprometimento da saúde mental (depressão, ansiedade mórbida, comportamento compulsivo) tem sido estudado pela psiquiatra Laura Helena Andrade, também pesquisadora da USP. É da vida, do tempo perdido, mas também da morte, literalmente, que estamos tratando.

Concluindo: para fazer frente a esse quadro, aqui apenas resumido, temos no Brasil leis, planos, conhecimento técnico, experiência, propostas maduras e testadas nas áreas de transporte, saneamento, drenagem, resíduos sólidos, habitação... Mas, além disso, o primeiro item necessário à política urbana hoje é a reforma política, em especial o financiamento de campanhas eleitorais. Então, que viva a moçada que ganhou as ruas. Se fizermos um bom trabalho pedagógico, teremos uma nova geração com uma nova energia para lutar contra a barbárie.

Ermínia Maricato

Professora titular da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP) e professora visitante da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Formulou a proposta do Ministério das Cidades, no qual foi ministra adjunta (2003-2005).


Este artigo faz parte do livro Cidades rebeldes: passe livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil, a ser lançado em agosto. A publicação (Boitempo e Carta Maior) terá 112 páginas e vai custar R$ 10 [e-book: R$ 5].

Figura de Régis Bonvecino

1 Ver, da autora, artigos anteriores que tratam do assunto em: .
2 Essas ideias, aqui toscamente rascunhadas, estão baseadas em bibliografia de autores que se ocuparam da leitura marxiana da questão urbana: Henri Lefebvre, David Harvey, Christian Topalov, Jean Lojkine, Alain Lipietz, Manuel Castells, Sergio Ferro e Nilton Vargas (esses dois últimos no Brasil), entre outros.
3 Cf. Julio Jacobo Waiselfisz, “2012 | A cor dos homicídios no Brasil”, Mapa da Violência. Disponível em: .
4 Marcio Pochmann, Nova classe média? Trabalho na pirâmide social brasileira, São Paulo, Boitempo, 2012.
5 Cf. a página da internet da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC). Disponível em: .
6 Idem.
7 Cf. as páginas na internet da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) e do Banco Central do Brasil. Disponíveis, respectivamente, em: e .
8 Cf. Teotônio Costa Rezende, “O papel do financiamento imobiliário no desenvolvimento sustentável do mercado imobiliário brasileiro”, palestra apresentada no Sindicato da Habitação (Secovi), São Paulo, 1º dez. 2012.
9 Ver Ana Fernandes, “Salvador, uma cidade perplexa”, Carta Maior, 21 set. 2012. Disponível em: ; e Jurema Rugani, “Participação social, a Copa, a cidade: como ficamos?”, Carta Maior, 24 ago. 2012. Disponível em: .
10 Ver Leticia Sigolo, “Sentidos do desenvolvimento urbano: Estado e mercado no boom imobiliário do ABCD” (título provisório), doutorado em andamento, FAU-USP.
11 Ver Luciana Ferrara, “Autoconstrução das redes de infraestrutura nos mananciais: transformação da natureza na luta pela cidade”, tese de doutorado, FAU-USP, 2013.
12 A respeito das remoções forçadas, ver o material de pesquisa coletado pelo grupo Observatório de Remoções, da FAU-USP. Disponível em: . Ver ainda o blog da urbanista e professora de arquitetura Raquel Rolnik: .
13 Sobre incêndios em favelas, ver João F. Finazzi, “Não acredite em combustão espontânea”, Carta Maior, 11 set. 2012. Disponível em: .
14 Cf. Companhia do Metropolitano de São Paulo – Metrô, Pesquisa origem e destino 2007. Disponível em: .
15 Ver Marcos Pimentel Bicalho, “O pesadelo da imobilidade urbana: até quando?”, Carta Maior, 4 jul. 2012.